Klaus Hart Brasilientexte

Aktuelle Berichte aus Brasilien – Politik, Kultur und Naturschutz

Brasilien und Kopenhagen-Konferenz: Brisante Studie über die zerstörerische Wirkung von Agrarreform-Ansiedlungen auf Urwald und Naturschutzgebiete. Mitautor Fabio Olmos ironisch: „Vorsicht, politisch unkorrekt!“

ASSENTAMENTOS DA REFORMA AGRÁRIA, MEIO AMBIENTE E UNIDADES DE

CONSERVAÇÃO

Fábio Olmos

Clóvis Ricardo Schrape Borges

Fernando Antonio dos Santos Fernadez

Ibsen de Gusmáo Câmara

Marcos Sá Correa

Maria de Lourdes Nunes

Miguel Serediuk Milano

Sérgio Brant Rocha

Verônica Theulen

Contexto Geral da Relaçáo entre Reforma Agrária e Meio Ambiente

”Tenho uma convicçáo que é uma obrigaçáo do Estado assentar gente no Norte e em terras públicas. O assentamento

na área também combate o desmatamento“.

 

 

Guilherme Cassel, Ministro do Desenvolvimento Agrário, em entrevista à Folha de Sáo Paulo em 31.01.2007

http://www.hart-brasilientexte.de/2009/11/25/klimakonferenz-kopenhagen-lulas-agrarreform-auf-kosten-amazoniens-neue-ansiedlungen-zerstoren-viermal-mehr-urwald-als-im-regionaldurchschnitt-laut-fabio-olmos-agrarreform-in-naturschutzgeb/

http://www.hart-brasilientexte.de/2009/11/17/lula-ankundigung-zur-senkung-des-ausstoses-klimaschadlicher-giftgase-ist-reine-rhetorik-laut-roberto-smeraldi-direktor-der-ngo-amigos-da-terra/

http://www.hart-brasilientexte.de/2009/11/26/was-gut-ist-stellen-wir-gros-heraus-was-schlecht-ist-verstecken-wir-rubens-ricupero-brasilianischer-politiker-ex-finanzminister-karrierediplomat-vertreter-brasiliens-in-uno-organisationen/

O paradigma do ”desenvolvimento sustentável permeou a questáo ambiental durante as últimas

décadas como um dogma, colocando em segundo plano avaliações objetivas da validade das

políticas econômicas e ambientais adotadas, bem como da verdadeira capacidade de suporte do

meio ambiente global e das próprias sociedades humanas em suprir as necessidades de

populações cada vez maiores e com consumo crescente.

Entre os principais recursos naturais, e sempre no rol dos mais disputados, estáo as terras

agriculturáveis. O equilíbrio, ou náo, entre a disponibilidade desse recurso e as populações a

demandá-lo constitui um dos grandes motores da História humana.

A questáo da reforma agrária no Brasil tem alimentado conflitos ao longo da história recente do

país. Isto se deve náo apenas às diferentes visões políticas sobre as justificativas e formas de

execuçáo do processo (e mesmo sua necessidade), mas também ao desempenho econômico

bastante desigual entre os assentamentos, dentre os quais parcela significativa é deficitária em

análises de custo-benefício.

Na raiz da questáo agrária está o contraste entre latifúndios que concentram terras, mas

demandam pouca máo-de-obra, e minifúndios com extensões insuficientes para garantir a

subsistência de famílias que tendem a crescer com o tempo. Um dos fatores relevantes na

construçáo do atual cenário foi a substituiçáo do regime de colonato pelo trabalho assalariado, de

demanda cada vez mais sazonal, atendida por trabalhadores temporários. Isto resultou em um

mercado de trabalho instável e restrito, incapaz de absorver o efetivo das populações rurais

(Young 2004).

A reforma agrária brasileira tem um longo histórico, com destaque para os projetos que datam dos

governos de Getúlio Vargas, iniciados na década de 1930, e que serviram de ponta de lança para a

ocupaçáo de regiões entáo despovoadas, como a Baixada Fluminense, o interior do Maranháo e o

atual Mato Grosso do Sul, em geral por migrantes deslocados por secas no nordeste. Os

benefícios sociais destes assentamentos sáo, até hoje, equívocos e neles está a raiz de conflitos

como os vividos pelos Guarani-Kaiowás no Mato Grosso do Sul (Brand 2006).

Mais recentemente, mesmo antes do final do regime militar pós-1964, com o reavivamento de

entidades de inspiraçáo socialista e revolucionária, como a Comissáo Pastoral da Terra (criada em

1979) e o Movimento dos Sem Terra (MST, criado em 1984), a questáo agrária ganhou momento.

As grandes mudanças na demografia e na economia brasileiras na segunda metade do século XX

– com o incremento da populaçáo de 41 para 119 milhões entre 1940 e 1980 — geraram o

excedente populacional que inchou as cidades e alimentou o surgimento de conflitos no campo.

Como ocorre no Brasil desde o início da colonizaçáo, estas populações foram utilizadas pelo poder

central para ocupar regiões que eram vistas como vazios demográficos. O deslocamento

espontâneo ou estimulado para áreas ainda ocupadas por ambientes naturais é uma das poucas

alternativas à migraçáo para os centros urbanos, mas apenas reinicia um ciclo vicioso alimentado

pelo motor demográfico. Como colocado por Furtado (1986) ”a populaçáo que náo encontra

trabalho nesta agricultura capitalista como assalariada permanece em terras de inferior qualidade

ou assume a tarefa de ir abrindo novas terras que seráo oportunamente incorporadas ao setor

capitalista.

”A expansáo da fronteira agrícola tem sido usada historicamente como válvula de escape para

acomodar este excedente populacional. Desse modo, inicialmente a Mata Atlântica e depois o

cerrado e atualmente a floresta amazônica têm sido reduzidos para que se possa acomodar os

conflitos de terra sem que uma reforma agrária seja efetuada nas áreas já ocupadas. Contudo, nas

novas áreas ocupadas reproduz-se o mesmo padráo de concentraçáo fundiária. Assim, após

algum tempo, a incapacidade de absorçáo de novos excedentes recria as condições para um novo

fluxo de migraçáo para áreas de floresta ainda náo convertidas (Young 2004).

A ocupaçáo destas áreas de fronteira ou ”marginais náo é isenta de conflitos. É emblemático da

esquecida dimensáo demográfica dos conflitos agrários no Brasil que o MST tenha surgido de um

núcleo de 110 famílias de posseiros, eles mesmos vindos de minifúndios, expulsos pelos índios

caingangues de sua atual reserva em Nonoai (RS), e que em 1979 procuraram resolver seu

problema invadindo uma fazenda em Ronda Alta (Scolese 2005).

Parte deste excedente populacional também se associou a movimentos sociais com uma visáo

política própria que preconizava o conflito com as instituições estabelecidas para implementar,

entre outras coisas, sua versáo de reforma social e agrária. O crescimento das organizações que

reivindicam o acesso à terra também se deve, em grande medida, à mobilizaçáo de setores da

sociedade na esteira da redemocratizaçáo do país, e à ocorrência de mártires do movimento em

conflitos como o de Eldorado de Carajás, o que mobilizou a opiniáo pública e deu justificava moral

às demandas do MST e assemelhados.

Os movimentos sociais dedicados à ”luta pela posse da terra se multiplicaram pelo país e hoje

existe um grande número de siglas que trabalham de forma conjunta ou competitiva, associadas

ou náo à Pastoral da Terra (que fomentou a origem de muitos desses movimentos). A invasáo de

propriedades, praças de pedágio e repartições públicas tornou-se lugar-comum no Brasil, assim

como a omissáo de governos instados a cumprir reintegrações de posse e fazer respeitar o direito

à propriedade.

O ”Abril Vermelho, tradiçáo do MST que comemora o massacre de Eldorado dos Carajás, em

2007 terminou com 81 invasões de fazendas, 17 invasões de prédios públicos, incluindo bancos

oficiais, e 25 invasões de praças de pedágio (apenas no Paraná), mobilizando aproximadamente

22 mil militantes (O Estado de Sáo Paulo 01.05./2007). As invasões incluíram áreas do Exército, de

universidades públicas e canteiros de obras de hidrelétricas, sendo subsidiadas pelo contribuinte,

já que os acampados recebem lonas e cestas básicas fornecidas pelo INCRA.

A ideologia de movimentos como o MST e sua parceira transnacional denominada Via Campesina

dá indícios de que seu interesse vai além da busca pela terra, como demonstram as invasões de

instalações de empresas reflorestadoras, usinas de álcool e produtoras de insumos agrícolas,

incluindo laboratórios de pesquisa, instalações consideradas como símbolos do capitalismo

transnacional ao qual atribuem os males do mundo.

Se esta é uma visáo de mundo válida, e se seria validada pela sociedade em um processo

democrático, sáo questões a serem respondidas. Contudo, os reflexos da forma pela qual a

questáo agrária é conduzida, especialmente como o Estado de Direito e as instituições criadas

para mantê-lo sáo percebidas, certamente deixaráo marcas profundas na estrutura social

brasileira e na governabilidade. Direitos garantidos na Constituiçáo Federal, como o direito à

propriedade e o direito de ir e vir, sáo violados sob a justificativa da ”justeza da luta social,

enquanto governos se mostram incapazes de agir de forma a assegurar o cumprimento da lei.

A destruiçáo de ambientes naturais é a marca registrada da ocupaçáo de terras, tanto pelo

agronegócio, quanto pela reforma agrária, mas náo está necessariamente associada ao

desenvolvimento econômico e social, já que o primeiro tende a concentrar renda e a última tem

falhado em gerá-la. Young (2004) demonstrou que os indicadores econômicos e sociais em

municípios na Mata Atlântica tendem a ter correlações negativas com as taxas de desmatamento.

Estudos recentes indicam que, na Amazônia, há estreita correlaçáo entre taxas de violência e

desmatamento nos municípios estudados, com destaque para aqueles situados na fronteira

agrícola matogrossense, onde convivem madeireiras e assentamentos de reforma agrária, como

C o l n i z a , o m u n i c í p i o m a i s v i o l e n t o d o p a í s

(http://www.agenciabrasil.gov.br/noticias/2007/04/07/materia.2007-04-07.2603608071).

Segundo Viana (1998) ”as terras da Gleba Colniza, [entáo no] Município de Aripuaná “ MT, foram

ocupadas por centenas de famílias de trabalhadores sem terra em 1996, com apoio do STR de

Aripuaná. As terras “ 333.000 hectares “ foram cedidas pelo Estado à Colonizadora Colniza que

náo executou o projeto dentro do prazo, graciosamente prorrogado pelo Governo Estadual. O

Governo Estadual interveio, fez acordo com a Colonizadora, que devolveu 17.000 hectares para o

assentamento de 360 famílias organizado pelo INTERMAT.

”Os madeireiros fizeram um acordo com os assentados para abertura de estrada de acesso e

desmate inicial dos lotes em troca de madeiras, inclusive mogno. O sucesso desta operaçáo

estimulou uma onda migratória para Colniza, proveniente principalmente de municípios de

Rondônia, além dos municípios do Noroeste de Mato Grosso, pela qual a demanda saltou de 360

famílias para 600 famílias e hoje chegou a 2.000 famílias que ocuparam quase todos os 333.000

hectares de terra, inclusive os lotes urbanos da colonizadora (Sede do Distrito).

”O Governo Federal, que em outra época foi agente ativo criando um Projeto de Assentamento em

terras florestadas contíguas às terras de Colonizadora (para atender os interesses desta), tornouse

um agente passivo do processo, esperando talvez que se esgote a ocupaçáo, e no futuro

intervenha regularizando a posse da terra. Os resultados sáo conhecidos. Em 2004 Colniza era

considerado o município mais violento do Brasil, com 165,3 homicídios por 100 mil habitantes,

contra 27,2 da média nacional (a média na Inglaterra do século XIV era 24/100 mil, caindo para

0,6/100 mil na década de 1960, Pinker 2007). No cenário brasileiro, é o quarto município com maior

taxa de desmatamento no período 2005-2006.

A reforma agrária “ ainda que em sua versáo de colonizadora de áreas de fronteira, em oposiçáo à

tomada de terras já ocupadas e sacrificando ambientes naturais em prol do social “ náo traz

necessariamente ”paz no campo. Ao contrário, na ausência do Estado, pode criar situações de

extremo conflito.

Além da dimensáo social, os impactos ambientais dos assentamentos associados ao processo de

reforma agrária têm recebido atençáo crescente. No passado recente (após 1960), a reforma

agrária foi uma das justificativas para grandes projetos de colonizaçáo realizados ao longo dos

eixos de rodovias como a BR 222, a Belém-Brasília, Transamazônica e a Cuiabá-Porto Velho.

Estes projetos resultaram em processos de desmatamento dramáticos, como observado no oeste

do Maranháo, norte do Tocantins e em Rondônia. Vale lembrar que a posse da terra, em todas

estas regiões, passou por novo processo de concentraçáo fundiária após a fase de ocupaçáo

inicial.

Propriedades consideradas ”improdutivas, segundo o conceito legal, náo sáo os únicos alvos de

invasões por movimentos de sem-terra. Áreas que deveriam ser conservadas, como reservas

legais, sáo um alvo freqüente e, em algumas regiões como o oeste do Maranháo, Bico do

Papagaio e partes do Pará, fazendeiros preferem desmatar totalmente suas propriedades e

enfrentar eventual fiscalizaçáo a sofrer a invasáo certa por ”sem-terras especializados no roubo

de madeira. O fato dos governos estaduais se negarem a cumprir reintegrações de posse garante

a impunidade. Vale registrar que em abril de 2007 mais de 127 mandados de reintegraçáo de

posse aguardavam cumprimento havia mais de dois anos no Pará (O Estado de Sáo Paulo

27.04.2007, A3).

O acesso a um recurso valioso que pode ser explorado e comercializado imediatamente faz com

que o fenômeno da invasáo de reservas legais seja generalizado da Amazônia ao Rio Grande do

Sul. Áreas protegidas como reservas particulares do patrimônio natural (RPPNs), estações

experimentais de instituições de pesquisa agropecuária e parques também sáo alvo de invasões.

Chaves (2006) dedica um capítulo a esta categoria de invasões, listando várias áreas de reserva

legal no Pontal do Paranapanema, a RPPN Fazenda Pimenteira (PA), a reserva do Instituto

Florestal de Sáo Paulo na Fazenda Campininha e o Parque Estadual da Serra das Andorinhas (PA)

como exemplos de áreas que sofreram invasões pelos sem-terra.

Além da destruiçáo de habitats resultante de qualquer atividade agropecuária implantada em

ambientes naturais, outros impactos causados pelos assentados incluem incêndios, exploraçáo

de madeira e plantas (como orquídeas, palmito, etc.) em áreas protegidas e caça, que pode ser

intensa o suficiente para resultar em extinções locais.

Mesmo em assentamentos considerados como ”modelos da reforma agrária, como a Fazenda

Anoni (Rio Grande do Sul), a exploraçáo predatória de recursos naturais é um lugar-comum, além

de, em geral, apenas uma parcela dos assentados alcançar auto-suficiência e ascensáo social

(veja p. ex. Barreto 2004). É fato inconteste que a reforma agrária brasileira, em parte significativa

dos assentamentos, tem combinado os aspectos negativos da insustentabilidade ambiental com

os da insustentabilidade econômica, sem resolver o problema social a que se propõe.

Estudo do IMAZON (Brandáo & Souza Jr. 2006) investigou o processo de desmatamento em

assentamentos na Amazônia Legal entre 1970 e 2002, quando 1.354 projetos cobrindo 230.858

km2 foram implantados para beneficiar 231.815 famílias. A maioria (88%) dos assentamentos foi

criada após 1995. É interessante notar que estes assentamentos, além de estarem associados às

rodovias, se concentram no ”Arco do Desmatamento, regiáo desmatada que ajudaram a criar,

especialmente no Pará, Rondônia e Mato Grosso.

Segundo o estudo supracitado, cerca de 49% da área total dos assentamentos havia sido

desmatada até 2004, representando 15% do desmatamento total na Amazônia. Contudo, a

situaçáo varia dramaticamente entre estados, com 75% da área total dos assentamentos

desmatada no Maranháo, 71% em Rondônia, 52% no Pará e 8% no Amazonas. Em geral, a taxa de

desmatamento nos assentamentos foi quatro vezes superior à média da Amazônia, estando

estreitamente associada à presença de rodovias.

Os assentamentos funcionam de forma sinérgica com outros fatores históricos de desmatamento,

como as grandes fazendas de gado, muitas vezes estabelecidas em terras griladas e subsidiadas

pelo Fundo Constitucional de Financiamento do Norte (FNO), que entre 1989 e 2002 disponibilizou

US$ 2,36 bilhões para o setor (Barreto et al. 2005), resultando em taxas locais de destruiçáo de

ambientes naturais extremamente altas. Em Rondônia, uma das últimas fronteiras colonizadas,

restam menos de 50% das florestas nas áreas náo incluídas em unidades de conservaçáo e terras

indígenas (Ferreira et al. 2005).

A reforma agrária na Amazônia, ao invés de visar à redistribuiçáo da terra, se deu a partir da

colonizaçáo de novas áreas, abertas a excedentes de máo-de-obra vindos de outras regiões,

notadamente do sul e do nordeste o país. Esta política de ocupaçáo regional trouxe graves

conseqüências ambientais e sociais, provocadas pelo abandono dos lotes e a posterior

reconcentraçáo das terras. As elevadas taxas de evasáo e de desmatamento comprovam a falta

de sustentabilidade econômica e ambiental desses assentamentos e seu fracasso (Pasquis et al.

2005).

Este processo histórico de degradaçáo ambiental associada às políticas públicas e à reforma

agrária persiste sem que suas lições alterem as políticas públicas, como a citaçáo que abre este

trabalho indica. Entre 2002 e 2004, 66% dos assentamentos foram criados na Amazônia Legal, em

terras da Uniáo. Segundo José Batista Afonso, da Comissáo Pastoral da Terra, ”sáo

assentamentos de faz-de-conta, feitos para inflar estatísticas. Na visáo de Rolf Hackbart, expresidente

do INCRA, ”é mais barato e mais ágil assentar naquelas áreas. Este trabalho também

contribui para a regularizaçáo fundiária na Amazônia Legal, combatendo a grilagem das terras (O

Estado de Sáo Paulo 04/set/2007).

O mesmo padráo de estabelecimento de assentamentos “ outrora observado ao longo de rodovias

amazônicas como as BR 364 e BR 222, e hoje renomeados ”projetos de desenvolvimento

sustentável “ está em curso ao longo do eixo das rodovias Cuiabá-Santarém e Transamazônica,

no Pará, com 39 projetos confirmados até janeiro de 2007, sendo que 24 foram criados nas três

últimas semanas de 2006. Nesta regiáo quase 700 mil ha deveráo ser destinados para 8 mil

famílias que, caso sejam mantidos os padrões conhecidos de ocupaçáo, repetiráo os desastres

observados em outros ”Projetos de Desenvolvimento Sustentável, ”Projetos de Assentamento

Agroextrativista e ”Projetos de Assentamento Florestal espalhados pela Amazônia.

Segundo Adalberto Veríssimo, do IMAZON (citado no Estado de Sáo Paulo de 04.04.2007) ”o

histórico dos projetos de desenvolvimento sustentado na Amazônia é desastroso e se contam nos

dedos os casos que deram certo.

Uma questáo relevante no processo de criaçáo de assentamentos é a facilidade com que o INCRA

pode criar um projeto deste tipo, a partir da publicaçáo de simples portaria, processo demasiado

simples quando comparado ao processo de criaçáo de uma unidade de conservaçáo. Esta

facilidade, aliada à baixa qualidade dos estudos que embasam a adequaçáo das áreas

selecionadas para a ocupaçáo e ao açodamento com que o Governo Federal aparentemente

deseja mostrar números crescentes de assentados, leva a distorções como assentamentos

sobrepostos a duas florestas nacionais e um parque nacional em dezenas de milhares de hectares

ao longo da BR 163.

Que projetos de assentamento para reforma agrária podem se tornar desastres ambientais náo é

novidade. Vale recordar a investigaçáo sobre madeireiras asiáticas na Amazônia realizada pelo

Congresso Nacional (Viana 1998) que, em seu capítulo sobre a reforma agrária, conclui:

· ”Há uma interface entre os projetos de assentamento de hoje e a extraçáo de madeira, seja por

corte raso, seja por corte seletivo, mas sempre sem critérios ambientalmente corretos. Isto

acontece em maior escala do que no período dos projetos de colonizaçáo das décadas de 70 e

80… Está claro para a Comissáo que muitos assentados descapitalizados e desassistidos

recorrem à venda de madeira para sua subsistência e para a conversáo de floresta em área de

cultivo, através do desmate e da queimada “ sem considerações ambientais locais e globais.

Essas práticas toleradas pelos governos soam como uma confissáo de sua responsabilidade

pelo o que acontece;

· ”Assim como o Programa de Colonizaçáo (98,87% de área e 93,02% da capacidade de

assentar famílias), o Programa Nacional de Reforma Agrária (1985-97) se transformou em

programa de desenvolvimento regional da Amazônia, ali concentrando 79,23% da área das

terras disponibilizadas e 65,42% da capacidade de assentamento de famílias… nos últimos 3

anos a Amazônia cedeu 76,15% das terras e absorveu 61,69% da capacidade de

assentamento de famílias;

· ”O Programa de Reforma Agrária, representado pelos projetos de assentamento náo tem

critérios ambientais, assim como náo tinham os projetos de colonizaçáo. Náo há diretrizes

estratégicas para orientar onde e quando se criar os projetos de assentamento, náo

importando se está ou náo assentando sobre ecossistemas sensíveis ou sob forte pressáo

antrópica ou além de sua capacidade de suporte. Prova disto é a predominância de projetos,

sobre variados ecossistemas da Amazônia, inclusive áreas críticas e sensíveis, seriamente

ameaçadas, como o Chapadáo dos Parecis (MT), área de floresta (em Rondônia, Mato Grosso

e Pará); e o mosaico de transiçáo vizinho a área indígena dos Yanomami em Roraima;

· ”Assim como náo há diretrizes estratégicas ambientais que orientem para sua localizaçáo, os

projetos de assentamento em sua própria estrutura náo seguem critérios ambientais: a

abertura de estradas, a localizaçáo do núcleo residencial e a divisáo em lotes náo respeitam as

particularidades ou as partes mais sensíveis dos ecossistemas atingidos como florestas,

nascentes e rios “ o que multiplica os impactos ambientais. Às vezes o INCRA implanta um

Projeto de Assentamento de mais de 100.000 hectares, sem qualquer estudo de impacto

ambiental;

· ”O assentado e o colono dos projetos de assentamento, como todo pequeno proprietário ou

posseiro da Amazônia, com as exceções de praxe, também vendem madeira extraída legal ou

ilegalmente, mas sempre insustentavelmente; também promovem o desflorestamento seja

para sua cultura de subsistência, à proporçáo média de 2 a 3 hectares/ano; seja para

pastagens. Aliás, nos últimos 3 anos o INCRA tem orientado os assentados beneficiados com

o PROCERA a comprar gado bovino, e os estimulado a fazer pastagens como critério para

regularizaçáo fundiária; e

· ”Colonos e assentados de programas federais e estaduais da Reforma Agrária na Amazônia

foram autorizados ao longo dos últimos 35 anos (porque antes disto é insignificante) a

desmatar cerca de 16 milhões de hectares, 15 milhões dos quais cobertos por florestas e as

evidências indicam que assim o fizeram e o fazem enquanto os outros 16 milhões de hectares

que compõem a reserva legal foram segmentados e sua fauna e flora expostas à exploraçáo

sem critério. Algumas áreas destinadas a projetos de assentamento provieram de fazendas

parcialmente desflorestadas (o que quase náo aconteceu com os projetos de colonizaçáo) em

contrapartida algumas áreas de reserva legal da floresta de projetos de colonizaçáo e

assentamento foram desmatados.

Quase uma década depois deste relatório ser publicado pelo Legislativo Federal, seu texto ainda é

atual.

Assentamentos de reforma agrária têm tido um papel muito importante como agentes de

destruiçáo ambiental também fora da Amazônia. Embora a Mata Atlântica tenha sido reduzida a

algo como 7% de sua área original e seja considerada patrimônio nacional, ao longo de toda a

década de 1990 e até o presente, assentamentos continuaram a ser estabelecidos em

remanescentes florestais, resultando na destruiçáo recente de importantes áreas em regiões

como o entorno da Reserva Biológica de Una, no sul da Bahia, e no oeste do Paraná.

Alguns desastres só foram evitados devido à firme posiçáo de proprietários em defesa dos

remanescentes naturais em suas áreas. Um exemplo foi a quase destruiçáo da que viria a se tornar

a reserva privada de patrimônio natural (RPPN) Cafundó, em Cachoeiro de Itapemirim (ES), por

um assentamento. Embora abrigasse populações de grande parte das espécies ameaçadas das

matas de tabuleiro do Espírito Santo — quase totalmente eliminadas “- somente o empenho do

proprietário em Brasília pode garantir a criaçáo da RPPN e impedir que a área fosse destruída.

Registre-se que o processo náo foi simples, uma vez que as tentativas de proteger a área foram

sabotadas pelo próprio IBAMA estadual, que apoiava os invasores. Hoje, a Cafundó é parte de um

projeto de construçáo de um corredor ecológico associado à Floresta Nacional de Pacotuba (veja

http://www.corredores.org.br).

Os assentamentos da reforma agrária estáo entre os grandes responsáveis pelo Paraná ter alguns

dos maiores índices de destruiçáo no bioma no início desta década. Em janeiro de 2005 foi

divulgado que o maior desmatamento identificado pela ONG SOS Mata Atlântica em seus 18 anos

de história ocorreu no município de Rio Bonito do Iguaçu, no centro-oeste do estado.

Em 1996 a área de floresta nativa da Fazenda Araupel — uma propriedade de 87.167 há — era de

33.254 ha, constituindo um dos maiores remanescentes de floresta com araucária que restavam

na época, e a maior extensáo florestada no Paraná após o maciço costeiro e o Parque Nacional do

Iguaçu, com o qual formava um corredor ao longo do rio homônimo. A propriedade abrigava pelo

menos 70 espécies de mamíferos, incluindo onças-pintadas Panthera onca e queixadas Tayassu

pecari (as últimas extintas no parque nacional) e mais de 300 de aves, como jacutingas Pipilejacutinga

, entre outras espécies ameaçadas (Bencke et al. 2006).

A propriedade era conhecida pelas grandes populações de queixadas (espécie criticamente em

perigo no Paraná) e catetos Pecari tajacu, que eram objeto de um programa de pesquisa e manejo

específicos. Com a invasáo pelo MST e o início da tradicional atividade de caça predatória, em três

anos a populaçáo de queixadas foi extinta pelos invasores, o que eliminou a possibilidade de

manejar a espécie para o parque nacional (Margarido 2004).

A Fazenda Araupel foi invadida, em 17 de abril de 1996, por 3.000 famílias do Movimento dos

Trabalhadores Sem-Terra (MST), que estabeleceram dois acampamentos na propriedade (Ireno

Alves e Magno Freire). As primeiras denúncias de desmatamento e caça predatória foram feitas ao

IBAMA logo em seguida. O IBAMA, em relatório emitido em 02 de agosto, já advertia que o

”assentamento descomunal seria uma ”fatalidade irreversível de degradaçáo ambiental.

Apesar disso, a destruiçáo continuou e em 2002 a área de floresta já havia encolhido para 22.640

ha. A inoperância e desinteresse dos governos federal e estadual, e os interesses políticos

envolvidos, fizeram com que mais 1.813 ha fossem perdidos entre 2003 e 2005, quando a

propriedade foi finalmente comprada para fins de reforma agrária.

Mais de 10 mil hectares de mata nativa foram dizimadas entre 1996 e 2005, e o restante

gravemente degradado por exploraçáo madeireira e incêndios, embora repetidas denúncias

tenham sido feitas pela Federaçáo da Agricultura do Estado o Paraná (FAEP 2004). Este foi um dos

maiores golpes sofridos pelas florestas maduras de araucária remanescentes no sul do Brasil,

ecossistema do qual restam menos de 2% da área original, e um dos maiores desastres

ambientais da década. Ao mesmo tempo, está em curso um processo promovido pelo Ministério

Público, decorrente do fato de a empresa proprietária ter recebido valores superfaturados durante

a desapropriaçáo.

Este desastre se repete em outras regiões. Da área total desapropriada pelo INCRA no Brasil entre

1997 e 1999, apenas 21,1% era terra com uso agrícola antes de sua ocupaçáo (Teófilo & Garcia

2003). E, sintomaticamente, os assentamentos de reforma agrária nos estados do domínio da

Mata Atlântica tendem a se agrupar nos municípios com maior média de remanescentes florestais

(SOS Mata Atlântica & INPE 2002).

A mesma atitude de descaso para com os impactos sobre áreas naturais por parte do INCRA e dos

”movimentos sociais em propriedades privadas ou terras públicas também é evidente quando as

áreas-alvo estáo no entorno, ou mesmo no interior de unidades de conservaçáo.

O mico-leáo-dourado Leontopithecus rosalia é um dos símbolos da natureza ameaçada no Brasil e

objeto de um dos maiores e mais longos projetos de conservaçáo, que desde 1984 envolve desde

a reintroduçáo de animais à educaçáo ambiental. Apesar disso, a Reserva Biológica de Poço das

Antas, crucial para a espécie, sofre com o cerco de acampamentos de sem-terra e assentamentos

da reforma agrária.

A Reserva Biológica do Poço das Antas foi criada em 1974 e era a única área protegida onde

ocorria esta espécie de primata. Depois de 21 anos de intensos esforços, a populaçáo de micos

está em recuperaçáo, mas ainda está bem abaixo de um número mínimo para uma populaçáo

viável de 2.000 indivíduos. Estudos de viabilidade têm demonstrado que sáo necessários pelo

menos 25.000 ha de florestas para a sobrevivência da espécie no longo prazo. No entanto, restam

apenas 2% das florestas na área de distribuiçáo original da espécie (Kierulff & Procópio de Oliveira,

1996), o que dá a cada remanescente importância vital para a reconstruçáo da conectividade da

paisagem e expansáo da cobertura florestal.

A relaçáo entre a reserva e os assentamentos é antiga (Cullen et al. 2005). De 9.800 ha

desapropriados pelo INCRA no município de Silva Jardim em 1974, 5.300 ha foram destinados à

criaçáo da reserva e o restante para a reforma agrária. O primeiro assentamento criado, Aldeia

Velha, limita-se ao norte com a reserva, originalmente com 900 ha e 91 famílias. Do total de

famílias assentadas, poucas dúzias ainda permanecem na área “ muitas propriedades foram

vendidas a residentes de cidades vizinhas para construçáo de casas de fim-de-semana, e outras

foram combinadas, tornando-se fazendas de gado. Este padráo é o habitual em todos os

assentamentos de reforma agrária. Além disso, a manutençáo da reserva legal de 20% foi

ignorada, e a vegetaçáo em áreas de declive acentuados e margens de cursos d’água foi na maior

parte destruída.

Um segundo assentamento foi criado pelo INCRA em 1994 para 104 famílias, como resultado da

ocupaçáo de uma propriedade de 1.200 ha (Cambucaes “ Olhos d’Água). A reserva legal entáo

existente foi dividida entre 19 famílias, que passaram a explorar a madeira e cortar a mata para

cultivar a área (Cullen et al. 2005).

Como é seu procedimento-padráo, nos novos assentamentos no entorno de Poço das Antas, o

INCRA ignorou a resoluçáo Conama 13/1990, que exige um Estudo Prévio de Impacto Ambiental

para a implementaçáo de qualquer atividade econômica de potencial impacto ambiental num raio

de 10 km de distância dos limites de unidades de conservaçáo de proteçáo integral. Em 1997, o

MST organizou a ocupaçáo de uma área de 500 ha de propriedade do INCRA e grilada por um

único proprietário rural. Um dos ocupantes iniciou um incêndio que se espalhou e causou danos

significativos à reserva biológica. Depois de ser oficialmente reconhecida como área de interesse

para reforma agrária em 1999, parte desta área foi destinada ao assentamento de 30 famílias.

Outras 83 famílias organizadas pelo MST ocuparam uma área similar, quando o IBAMA promoveu

açáo civil pública em face do INCRA, demandando o Estudo de Impacto Ambiental exigido pela lei

(Cullen et al. 2005).

Nesse cenário, as várias organizações ligadas ao projeto mico-leáo tentam trabalhar em conjunto

com as associações de assentados que hoje circundam a reserva, para minimizar os estragos

provocados (Cullen et al. 2005). A despeito disso, a caça continua a ser um problema sério na

reserva e os micos-leões continuam a ser oferecidos no comércio regional de animais (A. Pissinatti

com. pess. dez. 2006).

Outras unidades de conservaçáo também convivem com a pressáo imposta por assentamentos,

que constituem um dos principais fatores de sua degradaçáo. A Estaçáo Ecológica de Murici, em

Alagoas, criada apenas em 2000 — muito embora a proposta de criaçáo seja do final da década de

1970 — é a UC brasileira que abriga a maior concentraçáo de espécies ameaçadas de extinçáo,

incluindo algumas espécies restritas às parcas manchas que restam de florestas montanas na

Serra da Borborema (Tabarelli et al. 2006a,b, Bencke et al. 2006). A Estaçáo Ecológica de Murici é

um dos maiores remanescentes de florestas do Centro de Endemismo Pernambuco, e apresenta a

biota mais ameaçada no país “ com menos de 2% de área remanescente, e praticamente sem

áreas em estado avançado de sucessáo vegetal (Tabarelli et al. 2006a,b). A importância da área,

reconhecida a pelo menos três décadas, náo impediu que o INCRA criasse assentamentos no seu

entorno, incluindo parte da floresta remanescente. O resultado é que hoje mais de seis mil pessoas

utilizam lenha retirada da estaçáo, além de persistir a retirada de madeira para fins de construçáo e

a caça da pouca fauna remanescente.

A situaçáo trágica de Murici reflete o padráo geral no Centro Pernambuco, onde o INCRA tem

implantado assentamentos sempre associados às áreas de remanescentes naturais, que sáo

vistas como fonte de lenha e outros recursos a serem explorados, e eventualmente esgotados,

pelos assentados. O pouco da Mata Atlântica nordestina que escapou da expansáo da cana-deaçúcar

(mais recentemente durante o PROALCOOL) agora é queimado no altar da reforma

agrária, enquanto as poucas unidades de conservaçáo existentes permanecem, na prática,

abandonadas (Tabarelli et al. 2006b).

As situações de Poço das Antas e Murici náo sáo únicas. O descaso com a legislaçáo em geral, e

com as questões ambientais em particular, se reflete em assentamentos implantados no entorno

imediato de Unidades de Conservaçáo, usualmente à revelia de seus órgáos gestores. Exemplos

incluem o Parque Estadual do Alto Ribeira (PETAR) em Sáo Paulo, a APA Guaraqueçaba, no

Paraná, os parques nacionais Serra das Confusões e Serra da Capivara, no Piauí, a Reserva

Biológica de Poço das Antas, no Rio de Janeiro, a Reserva Biológica de Una, na Bahia, e o Parque

Nacional da Serra da Bodoquena, em Mato Grosso do Sul.

Em alguns casos o INCRA náo hesitou em implantar assentamentos ou emitir títulos no interior de

unidades de conservaçáo. Em Rondônia, onde 52 unidades estaduais foram criadas no âmbito do

PLANAFLORO, um fracassado projeto de ”desenvolvimento com conservaçáo, é um exemplo

didático, onde o INCRA foi instrumental na destruiçáo de unidades insubstituíveis como o Parque

Estadual de Corumbiara e o Parque Estadual Serra dos Parecis (Ribeiro et al. 2005). Como

exposto acima, assentamentos ao longo da BR 163 se sobrepõem com UCs criadas

anteriormente.

A vulnerabilidade de unidades de conservaçáo mais permissivas, como as áreas de proteçáo

ambiental (APAs), é ainda maior. A Área de Proteçáo Ambiental (APA) Bananal-Cantáo foi

decretada pelo Governo do Estado do Tocantins em maio de 1997. Seu objetivo era regulamentar a

ocupaçáo e proteger uma regiáo única onde o cerrado se encontra com a floresta amazônica do

vale do rio Araguaia. Em princípio seria possível conciliar a conservaçáo ambiental e a ocupaçáo

humana por meio do zoneamento da área e do respeito às normas por ele instituídas.

O Rio Caiapó é um dos principais afluentes do Rio Araguaia, e corta a área da APA. Seu encontro

com o Rio Araguaia forma um grande delta interno rico em lagos e florestas alagadas, onde ocorre

uma fauna rica que inclui ariranhas, jacarés-açus, botos, jacus-vermelhos e patos-corredores. O

médio rio Caiapó está acima da planície de inundaçáo do Araguaia e corta uma área de florestas

tropicais secas que, cercada por cerrados e pastagens, se mostra como grandes quadrados

irregulares dispostos ao longo do rio, clássica assinatura de áreas de reserva legal pertencentes a

grandes propriedades. Este conjunto de florestas foi considerado como ”zona de conservaçáo no

zoneamento da APA, mas isto náo impediu que o INCRA implantasse 28 assentamentos no interior

da APA, a maioria estrategicamente situada exatamente nas áreas de floresta da ”zona de

conservaçáo. Nessas áreas estáo concentrados os núcleos de desmatamento da regiáo, onde

ocorre rápida eliminaçáo de uma biota pouco conhecida e é comprometida a bacia de um dos

principais afluentes do Araguaia, já gravemente assoreado.

Embora se divulgue que em alguns assentamentos de reforma agrária haja ganhos ambientais,

por terem sido iniciados projetos de restauraçáo e conexáo de habitats em regiões desmatadas (p.

ex. no entorno o Parque Estadual do Morro do Diabo, em Sáo Paulo – Cullen et al. 2005), as

particularidades destes casos em relaçáo à situaçáo geral os tornam exceções à regra de que

assentamentos estabelecidos junto a áreas naturais sáo um desastre ambiental e náo uma

estratégia que pode ser utilizada de forma ampla.

Deve-se lembrar que o ”bom comportamento dos assentados se deve náo somente ao intenso

trabalho da organizaçáo náo governamental que difunde o projeto, mas resulta também da

intervençáo do Ministério Público resultante da ameaça ao Parque Estadual do Morro do Diabo e

de fatos como o incêndio das florestas da Gleba Tucano (hoje Estaçáo Ecológica Mico Leáo Preto)

e invasões de reservas legais por membros do MST.

Todos os casos e estudos relatados náo deixam dúvidas quanto à importância dos impactos

gerados pelos assentamentos sobre o meio ambiente em geral e sobre as áreas protegidas em

particular. Apesar disso, assentamentos da reforma agrária continuam a ser propostos no entorno

de unidades de conservaçáo de proteçáo integral e no interior das de ”uso sustentável, algumas

destas (as reservas extrativistas) sendo computadas como ”assentamentos pelo INCRA.

A reforma agrária, muito embora seja uma demanda válida de setores da sociedade, tornou-se

uma séria ameaça ao patrimônio natural do país, devido à sua forma de implementaçáo, que deve

ser modificada urgentemente. Mais que isso, a reforma agrária feita em áreas ambientalmente

sensíveis mostra facetas que váo além da questáo ambiental, com sérios equívocos — nos

conceitos, estratégias e operacionalizaçáo — que se traduzem em um enorme dispêndio de

recursos públicos

para manter um programa que, sob qualquer critério objetivo, longe de resolver

os desafios existentes, cria inúmeros problemas.

Dieser Beitrag wurde am Donnerstag, 26. November 2009 um 15:00 Uhr veröffentlicht und wurde unter der Kategorie Naturschutz, Politik abgelegt. Du kannst die Kommentare zu diesen Eintrag durch den RSS-Feed verfolgen.

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